Pesquisar este blog

quarta-feira, 25 de abril de 2012


Cuidados com o idoso: prevenção de quedas.
O risco do hematoma subdural


Ter um idoso em casa requer alguns cuidados e adaptações para que essa pessoa não seja surpreendida por uma queda. A ideia é de surpresa mesmo, porque a existência de um tapete no chão, de um piso mais liso, ou de objetos espalhados pela casa de forma inadequada pode levar o idoso à uma queda. Um queda pode não machucar visivelmente o idoso, mas essa pessoa possui características físicas, fisiológicas e funcionais, singulares e isso requer uma atenção maior da família e/ou cuidador.

Apresentaremos um caso específico de um senhor de oitenta anos de idade para mostrar todo o sofrimento de uma pessoa, e de uma família, gerado por uma queda que resultou num problema trinta dias depois do ocorrido. E tentaremos explicar o que é um Hematoma Subdural, pois os sintomas levam muitos a acreditar que o idoso teve um “Derrame”. Esse Hematoma pode ser originado de uma queda sem haver traumatismo craniano direto, ou seja, a pessoa pode não ter batido a cabeça.

Relato em primeira pessoa por Kátia dos Anjos sobre seu avô

No dia doze de julho de 2011 meu avô, Canuto Martins dos Anjos, passou mal, minha avó relata que ele durante a noite ficou inquieto, com a fala desordenada, confuso, também começou a ficar com o lado direito do corpo dormente e caiu da cama. No dia seguinte, treze de julho, meu tio ligou para meu pai para contar o que havia acontecido. Ele ligou e falou com meu pai chorando.

Meus avós moram no oeste da Bahia, num local chamado lagoa do Rufino pertencente ao município de Serra Dourada, uma cidade rural. Eles moram na “roça”, longe de qualquer “luxo” e tecnologia avançada, lá minimamente há energia elétrica que foi colocada não faz muito tempo (por volta do ano de 2000) e algumas pessoas já possuem telefone. A vida é simples, as pessoas dormem cedo e acordam antes do sol raiar.

O meio de transporte mais comum ainda é a bicicleta, sempre que eles precisam ir à cidade usam a bicicleta para chegar a um determinado local chamado Campina Larga, e depois pegam um ônibus. São mais ou menos 5 ou 6 quilômetros andando da casa dos meus avós até esse local e depois mais uma hora e meia para chegar a cidade mais próxima.

Essa breve descrição de onde eles vivem serve para eu explicar como meu avô ficou com esse problema, o hematoma subdural. Num belo dia meu avô pega sua bicicleta para ir fazer o percurso até o ponto do ônibus, minha avó também foi, mas na garupa da bicicleta do meu tio, eles saíram de madrugada com o céu escuro, nesse dia eles iam fazer compras e meu avô levava em suas mãos um pacote. Meu tio estava na frente do meu avô, mas logo ele resolveu ultrapassá-lo e foi pela contramão, nesse momento outra pessoa também de bicicleta estava se aproximando com uma velocidade maior que a do meu avô; e infelizmente, houve um choque entre eles e meu avó, mais frágil, caiu.

Nessa queda ele afirma que não bateu a cabeça, que somente caiu e teve que apoiar o braço esquerdo e a perna esquerda no chão, mas pelo relato de minha avó a queda até entortou a bicicleta, ou seja, o impacto foi forte. Mesmo ele afirmando que não bateu a cabeça, suspeitamos que isso, a batida da cabeça, tenha acontecido, porque ele ficou com um hematoma logo a baixo do olho esquerdo. Isso ocorreu no mês de maio de 2011, mas só em julho ele ficou realmente ruim.

No dia seguinte, após ter passado mal durante a noite, ele foi levado até Serra Dourada-BA para ser examinado no hospital municipal, chegando lá o médico, por dedução, disse que meu avô teve um derrame e que o caso dele não teria solução, em seguida prescreveu fisioterapia. Nesse hospital não há recursos materiais para o atendimento da população e suponho que o médico que o atendeu seja uma generalista, um clínico geral.

Não contente com a avaliação do médico minha avó logo pensou em chamar meu pai, pois aqui em São Paulo poderia ser mais fácil de tratar meu avô e saber realmente qual o problema que ele tinha. Meu pai foi para a Bahia imediatamente e trouxe meus avós de carro para São Paulo. Chegaram aqui no dia vinte e dois de julho de madrugada, e assim que amanheceu foram para a OSS (Organização Social de Saúde) Hospital Geral Santa Marcelina de Itaquaquecetuba, lá meu pai ficou o dia inteiro com meu avô, fizeram vários exames nele, de sangue e tomografia computadorizada (lá na Bahia o exame de sangue foi marcado, mas com um intervalo de trinta dias), além de ser medicado.

O médico ao ver o exame de tomografia já avisou que ele seria internado e faria a cirurgia naquela noite, pois havia sido diagnosticado um coágulo no cérebro, mas antes disso o médico deu uma bronca nos meus pais pela demora no atendimento do meu avô, eles (os médicos) não sabiam que meu avô tinha passado em um médico na Bahia.

Dia vinte e dois de julho de 2011 foi feita a primeira cirurgia para drenar o hematoma, no dia trinta foi colocado um dreno para retirar mais liquido, pois havia acumulado novamente, no dia quatro de agosto, após a retirada do dreno, mesmo não estando bem ainda, ele recebeu alta. Em casa meu avô não estava melhorando e apresentava muita sonolência e confusão mental além de dores. Dia sete de agosto meu pai decide levar meu avô ao hospital, isso antes do retorno prescrito pelo médico, ele ligou para o serviço de emergência, SAMU, e logo eles chegaram a nossa casa, dois homens um motorista e um socorrista, porém ao saber que meu avô precisaria ser carregado até a ambulância o socorrista, um homem jovem, disse que não poderia pegar peso, pois havia sofrido um infarto fazia pouco tempo, sendo assim meu pai e o Leandro (meu namorado) colocaram meu avô na cadeira de rodas e o socorrista só empurrou a cadeira.

Nesse retorno foi constatado que meu avô estava com uma infecção, empiema subdural (uma coleção de pus entre o cérebro e o tecido que o envolve - as meninges-), assim sendo ele teve que ser submetido a outro procedimento cirúrgico. No dia nove de agosto os médicos fizeram uma abertura maior do lado esquerdo da cabeça, realmente abriram a cabeça (craniotomia) e fizeram uma limpeza, esse osso ficou solto, o médico disse que com o tempo ele calcificaria. Além disso, meu avô teve que tomar antibiótico por mais ou menos quarenta dias, um dos medicamentos foi a vancomicina. Durante o uso da vancomicina meu avô foi melhorando, retomando a consciência, mas às vezes tinha crises de broncoespasmo (tossia sem parar, quase perdendo o fôlego). O hemicorpo direito apresentava paresia, o membro inferior apresentava sensibilidade e pouco movimento e o membro superior só apresentava sensibilidade e não movimentava, os médicos disseram que meu avô poderia ficar com sequelas, mas observamos que no fim do uso dos antibióticos o membro superior começou a apresentar uma leve movimentação o que alegrou meu avô.

Prestes a receber alta, meu pai observou que havia uma pequena parte da cabeça do meu avô onde não ocorreu epitelização (um pedacinho de osso ficou exposto), o médico prescreveu um pomada, mas que não surtiu efeito. Sendo assim, ele novamente foi submetido a outro procedimento cirúrgico e tiverem que retirar o tecido ósseo que havia ficado solto, pois ele não calcificou, estava necrosado. Dia vinte e nove de setembro o tecido foi retirado.

No dia cinco de outubro ele teve alta hospitalar e observamos dia após dia seu progresso, sua recuperação; ele teve outra crise de broncoespasmo, mas nada que nos conduzisse às pressas para o hospital. O nosso maior problema atualmente está no aspecto psicológico, emocional, pois meu avô muitas vezes chora e sente-se um “peso” para a família, além de preocupar-se com sua vida e suas coisas na roça, na Bahia. Parece que o trabalho dá sentido a sua vida, ou melhor, fica evidente como isso é importante para ele, e o fato de estar frágil, hemiparético, o faz sentir-se um nada, alguém que não tem domínio do seu próprio corpo, que não pode tomar suas próprias decisões.

No dia vinte e seis de outubro ele retornou para o hospital para retirar os pontos e o médico fez uma avaliação. Ele estava bem. 

Dia cinco de novembro ele deu seus primeiros passos sozinhos com o auxílio de uma bengala e com meu pai do lado, mas sem exercer influência na condução. Foram poucos passos, não muito eficientes, mas que deixou todos da família felizes, isso é só o começo.
Dia vinte e oito de dezembro de 2011 ele retornou ao médico. 
Estamos em abril de 2012 e ele está se recuperando, ainda não consegue andar sozinho...
O Hematoma Subdural
Os hematomas subdurais afetam a convexidade cerebral sendo que a origem mais comum dos hematomas subdurais é a ruptura de veias tributárias do seio sagital superior. São calibrosas, de paredes delgadas e podem romper-se por acelerações ou freadas bruscas no plano sagital, em que sofrem estiramentos.
A velocidade de formação do hematoma é variável de horas a dias. Inicialmente o sangue se coagula. Os hematomas subdurais agudos podem causar hipertensão intracraniana elevada e hérnias1. A abordagem deste hematoma é feita através de craniotomia ampla que permita a sua total aspiração e uma eventual descompressão da contusão e do inchaço (NITRINI, 2008).
Hematoma Subdural Crônico

O Hematoma Subdural Crônico (HSDC) é caracterizado essencialmente como uma patologia em que há uma reunião, ou aglutinamento sanguíneo com variação de degeneração, encapsulada ( um coágulo), de evolução crônica (de acordo com algumas classificações com mais de vinte dias a partir do ocorrido), localizada entre a dura-máter e aracnóide - essas são as membranas que revestem nosso cérebro, as meninges -  (DANTAS et al, 2005).

De acordo com o autor supracitado a etiopatogenia do HSDC é decorrente de vários fatores de risco, mas focaremos em apenas dois , pois vão de encontro com nosso caso, são eles:
  • A idade, pois de acordo com o autor a uma concordância entre teóricos de que há um prevalência de HSDC entre idosos, principalmente no caso de trauma leve, atrofia cortical generalizada e fragilidade venosa, aspectos encontrados principalmente em idosos2;

  • Quedas, o autor descreve estatisticamente que cerca de 50% dos pacientes relatam quedas, porém sem trauma crânio encefálico direto. Assim supõe-se que um evento, trauma reconhecido como natural, possa passar despercebido na história do paciente3.

Características do cérebro do idoso
De acordo com Ferretti (2008) alterações no encéfalo, decorrentes do processo de envelhecimento podem acontecer. Mudanças com relação ao peso, volume e densidade deste órgão, provavelmente surgirão, porém embora aconteçam no envelhecimento, necessariamente não irão ocorrer da mesma maneira em todos os idosos, vários aspectos como nível de escolaridade e a presença de doenças irão determinar a ocorrência, ou não, desse processo.

Essa característica morfológica, anatômica, do cérebro do idoso, ou seja, de perda, diminuição, com avanço da idade nos leva a um aspecto fundamental, a característica do indivíduo e a probabilidade de ocorrência de traumas provenientes de situações cotidianas como, por exemplo, o hábito de andar de bicicleta e uma casa não adaptada a realidade do idoso; podendo gerar graves consequências no futuro, neurológicas e físicas/ estruturais e funcionais.

Esse espaço maior entre o encéfalo e o crânio permite uma maior mobilidade do cérebro, que em determinadas situações, como quedas ou batida de carro podem gerar uma lesão cerebral; se lembrarmos do princípio da inércia podemos compreender esse fenômeno, “um objeto que está em movimento não mudará a sua velocidade a não ser que uma força resultante aja sobre ele”. O individuo idoso pode ter parado, mas devido a ação brusca seu cérebro que tem um espaço maior dentro do crânio continua em movimento sendo então lesionado.

Lesão Cerebral (Sinais e Sintomas)
 No caso apresentado a lesão parece ter sido gerar por Golpe-Contragolpe, que de acordo com Frandsen et al (2002) é o tipo de lesão mais comum, gerada por aceleração-desaceleração, em que a cabeça sofre uma parada súbita, mas o cérebro continua a se movimentar. No caso do idoso, como já vimos isso é muito grave, pois o espaço entre o encéfalo e o crânio é maior, logo a possibilidade de “chacoalhar” o cérebro e a ocorrência de lesão é maior, mesmo o trauma sendo pequeno ou quase “insignificante” para alguns.

Os sinais e sintomas de acordo com esses autores, podem não aparecer de imediato após a lesão. Eles apontam alguns sinais de aumento na pressão intracraniana como:
  • Alteração na responsividade da vítima;
  • Combatividade e comportamento errático;
  • Dor de cabeça, às vezes intensa;
  • Perda de memória, confusão ou desorientação;
  • Fraqueza ou perda de equilíbrio;
  • Crises convulsivas;
Esses são só alguns dos sinais que um sujeito pode apresentar.

Tem outras curiosidades sobre cuidados com idosos? Acesse o portal da saúde do Ministério da Saúde.

Referencias Bibliográficas

  • FERRETTI, R.E de L. Fatores associados às alterações morfométricas crânio-encefálicas no envelhecimento – São Paulo, 2008. Tese (doutorado)- Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Departamento de patologia.
  • FRANDESEN et al. Primeiros Socorros para estudantes. Editora Manole,2002.
  • NITRINI, R; BACHESCHI, L. A; A Neurologia que todo Medico Deve Saber. Paginas 189 a 203, Editora Atheneu, Segunda Edição, 2008

1 Site
2 Idem
3 Idem

2 comentários:

  1. Muito interessante o quanto uma queda, que parece simples, por não envolver uma "batida" direta da cabeça, pode ser tão complexa e gerar tantas complicações! Reiterando mais uma vez a necessidade e importância de se evitar quedas deste porte, principalmente em crianças e idosos, e caso estas ocorram, de procurar uma avaliação médica para garantir que problemas maiores venham a ocorrer.....as vezes mesmo depois de meses. abraços - Juliana Cristiane

    ResponderExcluir