Cuidados
com o idoso: prevenção de quedas.
O
risco do hematoma subdural
Ter um idoso em casa
requer alguns cuidados e adaptações para que essa pessoa não seja
surpreendida por uma queda. A ideia é de surpresa mesmo, porque a
existência de um tapete no chão, de um piso mais liso, ou de
objetos espalhados pela casa de forma inadequada pode levar o idoso à
uma queda. Um queda pode não machucar visivelmente o idoso, mas essa
pessoa possui características físicas, fisiológicas e funcionais,
singulares e isso requer uma atenção maior da família e/ou
cuidador.
Apresentaremos um
caso específico de um senhor de oitenta anos de idade para mostrar
todo o sofrimento de uma pessoa, e de uma família, gerado por uma
queda que resultou num problema trinta dias depois do ocorrido. E
tentaremos explicar o que é um Hematoma Subdural, pois os sintomas
levam muitos a acreditar que o idoso teve um “Derrame”. Esse
Hematoma pode ser originado de uma queda sem haver traumatismo
craniano direto, ou seja, a pessoa pode não ter batido a cabeça.
Relato em primeira pessoa por Kátia dos Anjos sobre seu avô
No dia doze de julho de 2011 meu avô, Canuto Martins dos Anjos,
passou mal, minha avó relata que ele durante a noite ficou inquieto,
com a fala desordenada, confuso, também começou a ficar com o lado
direito do corpo dormente e caiu da cama. No dia seguinte, treze de julho, meu
tio ligou para meu pai para contar o que havia acontecido. Ele ligou
e falou com meu pai chorando.
Meus avós moram no oeste da Bahia, num local chamado lagoa do
Rufino pertencente ao município de Serra Dourada, uma cidade rural.
Eles moram na “roça”, longe de qualquer “luxo” e tecnologia
avançada, lá minimamente há energia elétrica que foi colocada não
faz muito tempo (por volta do ano de 2000) e algumas pessoas já
possuem telefone. A vida é simples, as pessoas dormem cedo e acordam
antes do sol raiar.
O meio de transporte mais comum ainda é a bicicleta, sempre que
eles precisam ir à cidade usam a bicicleta para chegar a um
determinado local chamado Campina Larga, e depois pegam um ônibus.
São mais ou menos 5 ou 6 quilômetros andando da casa dos meus avós
até esse local e depois mais uma hora e meia para chegar a cidade
mais próxima.
Essa breve descrição de onde eles vivem serve para eu explicar
como meu avô ficou com esse problema, o hematoma subdural.
Num belo dia meu avô pega sua bicicleta para ir fazer o percurso até
o ponto do ônibus, minha avó também foi, mas na garupa da
bicicleta do meu tio, eles saíram de madrugada com o céu escuro,
nesse dia eles iam fazer compras e meu avô levava em suas mãos um
pacote. Meu tio estava na frente do meu avô, mas logo ele resolveu
ultrapassá-lo e foi pela contramão, nesse momento outra pessoa
também de bicicleta estava se aproximando com uma velocidade maior
que a do meu avô; e infelizmente, houve um choque entre eles e meu
avó, mais frágil, caiu.
Nessa queda ele afirma que não bateu a cabeça, que somente caiu e
teve que apoiar o braço esquerdo e a perna esquerda no chão, mas
pelo relato de minha avó a queda até entortou a bicicleta, ou seja,
o impacto foi forte. Mesmo ele afirmando que não bateu a cabeça,
suspeitamos que isso, a batida da cabeça, tenha acontecido, porque
ele ficou com um hematoma logo a baixo do olho esquerdo. Isso ocorreu
no mês de maio de 2011, mas só em julho ele ficou realmente ruim.
No dia seguinte, após ter passado mal durante a noite, ele foi
levado até Serra Dourada-BA para ser examinado no hospital
municipal, chegando lá o médico, por dedução, disse que meu avô
teve um derrame e que o caso dele não teria solução, em seguida
prescreveu fisioterapia. Nesse hospital não há recursos materiais
para o atendimento da população e suponho que o médico que o
atendeu seja uma generalista, um clínico geral.
Não contente com a avaliação do médico minha avó logo pensou em
chamar meu pai, pois aqui em São Paulo poderia ser mais fácil de
tratar meu avô e saber realmente qual o problema que ele tinha. Meu
pai foi para a Bahia imediatamente e trouxe meus avós de carro para
São Paulo. Chegaram aqui no dia vinte e dois de julho de madrugada,
e assim que amanheceu foram para a OSS (Organização Social de
Saúde) Hospital Geral Santa Marcelina de Itaquaquecetuba, lá meu
pai ficou o dia inteiro com meu avô, fizeram vários exames nele, de
sangue e tomografia computadorizada (lá na Bahia o exame de sangue
foi marcado, mas com um intervalo de trinta dias), além de ser
medicado.
O médico ao ver o exame de tomografia já avisou que ele seria
internado e faria a cirurgia naquela noite, pois havia sido
diagnosticado um coágulo no cérebro, mas antes disso o médico deu
uma bronca nos meus pais pela demora no atendimento do meu avô, eles
(os médicos) não sabiam que meu avô tinha passado em um médico na
Bahia.
Dia vinte e dois de julho de 2011 foi
feita a primeira cirurgia para drenar o hematoma, no dia trinta
foi colocado um dreno para retirar mais liquido, pois havia acumulado
novamente, no dia quatro de agosto, após a retirada do dreno, mesmo
não estando bem ainda, ele recebeu alta. Em casa meu avô não
estava melhorando e apresentava muita sonolência e confusão mental
além de dores. Dia sete de agosto meu pai decide levar meu avô ao
hospital, isso antes do retorno prescrito pelo médico, ele ligou
para o serviço de emergência, SAMU, e logo eles chegaram a nossa
casa, dois homens um motorista e um socorrista, porém ao saber que
meu avô precisaria ser carregado até a ambulância o socorrista, um
homem jovem, disse que não poderia pegar peso, pois havia sofrido um
infarto fazia pouco tempo, sendo assim meu pai e o Leandro (meu
namorado) colocaram meu avô na cadeira de rodas e o socorrista só
empurrou a cadeira.
Nesse retorno foi constatado que meu avô estava com uma infecção,
empiema subdural (uma
coleção de pus entre o cérebro e o tecido que o envolve - as
meninges-),
assim sendo ele teve que ser submetido a outro procedimento
cirúrgico. No dia nove de agosto os médicos fizeram uma abertura
maior do lado esquerdo da cabeça, realmente abriram a cabeça
(craniotomia) e fizeram uma limpeza, esse osso ficou solto, o médico
disse que com o tempo ele calcificaria. Além disso, meu avô teve
que tomar antibiótico por mais ou menos quarenta dias, um dos
medicamentos foi a vancomicina. Durante o uso da vancomicina meu avô
foi melhorando, retomando a consciência, mas às vezes tinha crises
de broncoespasmo (tossia sem parar, quase perdendo o fôlego). O
hemicorpo direito apresentava paresia, o membro inferior apresentava
sensibilidade e pouco movimento e o membro superior só apresentava
sensibilidade e não movimentava, os médicos disseram que meu avô
poderia ficar com sequelas, mas observamos que no fim do uso dos
antibióticos o membro superior começou a apresentar uma leve
movimentação o que alegrou meu avô.
Prestes a receber alta, meu pai observou que havia uma pequena parte
da cabeça do meu avô onde não ocorreu epitelização (um pedacinho
de osso ficou exposto), o médico prescreveu um pomada, mas que não
surtiu efeito. Sendo assim, ele novamente foi submetido a outro
procedimento cirúrgico e tiverem que retirar o tecido ósseo que
havia ficado solto, pois ele não calcificou, estava necrosado. Dia
vinte e nove de setembro o tecido foi retirado.
No dia cinco de outubro ele teve alta hospitalar e observamos dia
após dia seu progresso, sua recuperação; ele teve outra crise de
broncoespasmo, mas nada que nos conduzisse às pressas para o
hospital. O nosso maior problema atualmente está no aspecto
psicológico, emocional, pois meu avô muitas vezes chora e sente-se
um “peso” para a família, além de preocupar-se com sua vida e
suas coisas na roça, na Bahia. Parece que o trabalho dá sentido a
sua vida, ou melhor, fica evidente como isso é importante para ele,
e o fato de estar frágil, hemiparético, o faz sentir-se um nada,
alguém que não tem domínio do seu próprio corpo, que não pode
tomar suas próprias decisões.
No dia vinte e seis de outubro ele retornou para o hospital para
retirar os pontos e o médico fez uma avaliação. Ele estava bem.
Dia cinco de novembro
ele deu seus primeiros passos sozinhos com o auxílio de uma bengala
e com meu pai do lado, mas sem exercer influência na condução.
Foram poucos passos, não muito eficientes, mas que deixou todos da
família felizes, isso é só o começo.
Dia vinte e oito de dezembro de 2011 ele retornou ao médico.
Estamos em abril de 2012 e ele está se recuperando, ainda não consegue andar sozinho...
O Hematoma Subdural
Os
hematomas subdurais afetam a convexidade cerebral sendo que a origem
mais comum dos hematomas subdurais é a ruptura de veias tributárias
do seio sagital superior. São calibrosas, de paredes delgadas e
podem romper-se por acelerações ou freadas bruscas no plano
sagital, em que sofrem estiramentos.
A
velocidade de formação do hematoma é variável de horas a dias.
Inicialmente o sangue se coagula. Os hematomas subdurais agudos podem
causar hipertensão intracraniana elevada e hérnias.
A abordagem deste hematoma é feita através de craniotomia ampla que
permita a sua total aspiração e uma eventual descompressão da
contusão e do inchaço (NITRINI,
2008).
Hematoma Subdural Crônico
O Hematoma Subdural Crônico (HSDC) é caracterizado essencialmente
como uma patologia em que há uma reunião, ou aglutinamento
sanguíneo com variação de degeneração, encapsulada ( um
coágulo), de evolução crônica (de acordo com algumas
classificações com mais de vinte dias a partir do ocorrido),
localizada entre a dura-máter e aracnóide - essas são as membranas
que revestem nosso cérebro, as meninges - (DANTAS
et al, 2005).
De acordo com o autor supracitado a etiopatogenia do HSDC é decorrente de
vários fatores de risco, mas focaremos em apenas dois , pois vão
de encontro com nosso caso, são eles:
A idade, pois de acordo com o autor a uma concordância entre
teóricos de que há um prevalência de HSDC entre idosos,
principalmente no caso de trauma leve, atrofia cortical generalizada
e fragilidade venosa, aspectos encontrados principalmente em
idosos;
Quedas, o autor descreve estatisticamente que cerca de 50%
dos pacientes relatam quedas, porém sem trauma crânio encefálico
direto. Assim supõe-se que um evento, trauma reconhecido como
natural, possa passar despercebido na história do paciente.
Características
do cérebro do idoso
De acordo com Ferretti (2008)
alterações no encéfalo, decorrentes do processo de envelhecimento
podem acontecer. Mudanças com relação ao peso, volume e densidade
deste órgão, provavelmente surgirão, porém embora aconteçam no
envelhecimento, necessariamente não irão ocorrer da mesma maneira
em todos os idosos, vários aspectos como nível de escolaridade e a
presença de doenças irão determinar a ocorrência, ou não, desse
processo.
Essa característica morfológica, anatômica, do cérebro do idoso,
ou seja, de perda, diminuição, com avanço da idade nos leva a um
aspecto fundamental, a característica do indivíduo e a
probabilidade de ocorrência de traumas provenientes de situações
cotidianas como, por exemplo, o hábito de andar de bicicleta e uma
casa não adaptada a realidade do idoso; podendo gerar graves
consequências no futuro, neurológicas e físicas/ estruturais e
funcionais.
Esse espaço maior
entre o encéfalo e o crânio permite uma maior mobilidade do
cérebro, que em determinadas situações, como quedas ou batida de
carro podem gerar uma lesão cerebral; se lembrarmos do princípio da
inércia podemos compreender esse fenômeno, “um
objeto que está em movimento não mudará a sua velocidade a não
ser que uma força resultante aja sobre ele”.
O
individuo idoso pode ter parado, mas devido a ação brusca seu
cérebro que tem um espaço maior dentro do crânio continua em
movimento sendo então lesionado.
Lesão Cerebral (Sinais e Sintomas)
No caso apresentado a lesão parece ter sido gerar por
Golpe-Contragolpe, que de acordo com Frandsen
et al (2002) é o tipo de lesão mais comum, gerada por
aceleração-desaceleração, em que a cabeça sofre uma parada
súbita, mas o cérebro continua a se movimentar. No caso do idoso,
como já vimos isso é muito grave, pois o espaço entre o encéfalo
e o crânio é maior, logo a possibilidade de “chacoalhar” o
cérebro e a ocorrência de lesão é maior, mesmo o trauma sendo
pequeno ou quase “insignificante” para alguns.
Os sinais e sintomas de acordo com esses autores, podem não
aparecer de imediato após a lesão. Eles apontam alguns sinais de
aumento na pressão intracraniana como:
Alteração na responsividade da vítima;
Combatividade e comportamento errático;
Dor de cabeça, às vezes intensa;
Perda de memória, confusão ou desorientação;
Fraqueza ou perda de equilíbrio;
Crises convulsivas;
Esses
são só alguns dos sinais que um sujeito pode apresentar.
Tem outras curiosidades sobre cuidados com idosos?
Acesse o portal da saúde do Ministério da Saúde.
Referencias
Bibliográficas
FERRETTI,
R.E de L. Fatores
associados às alterações morfométricas crânio-encefálicas no
envelhecimento
– São Paulo, 2008. Tese (doutorado)- Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo. Departamento de patologia.
FRANDESEN
et al. Primeiros Socorros para estudantes. Editora
Manole,2002.
NITRINI,
R; BACHESCHI, L. A; A Neurologia que todo Medico Deve Saber.
Paginas 189 a 203, Editora Atheneu, Segunda Edição, 2008
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